
O design não é custo:
é infraestrutura econômica
Durante décadas, o design foi visto como estética, e a experiência, como um acessório ao produto. Essa visão, embora confortável, envelheceu mal.
Na economia contemporânea, o design deixou de ser forma para se tornar função de retorno, uma infraestrutura invisível que reduz custos marginais, aumenta a velocidade de decisão e expande o valor percebido pelo cliente.
Empresas de vanguarda entenderam que experiência é eficiência.
Cada ponto de contato simplificado, cada interface que poupa segundos e reduz atrito, multiplica o retorno marginal sobre investimento. Não por acaso, o design deixou de competir por relevância e passou a competir por ROI.
Como ensina a Bain & Company, o valor percebido nasce da interseção entre conveniência e confiança. É exatamente nessa fronteira que o design opera: transformando percepção em produtividade.
Essa mudança de mentalidade ficou muito clara durante um dos desafios mais interessantes que vivemos na Midway: transformar UX em infraestrutura de negócio, conectando a experiência do cliente a indicadores reais de performance.
O paradoxo do ROI em UX
O dilema do ROI em UX é que o impacto real do design raramente cabe em planilhas. Mede-se o que é tangível, tempo de carregamento, taxa de conversão, NPS mas o que sustenta o crescimento é intangível: confiança, recorrência, fluidez cognitiva. Essa miopia faz com que muitos executivos vejam o design como custo fixo, quando na verdade ele atua como um ativo de amortização organizacional.
De forma análoga à economia de produção, o UX opera sobre uma curva de eficiência marginal. O primeiro investimento em design reduz atrito e aumenta conversão; o segundo, elimina redundâncias; o terceiro, consolida aprendizado e cria escala. O retorno decresce apenas para quem insiste em medir experiência como projeto, e não como sistema de valor acumulativo.
O erro não está na planilha, mas no modelo mental.
Enquanto se mede UX por feature, deveria-se medir por curva de eficiência, o quanto cada melhoria reduz custo marginal, aumenta receita marginal ou acelera o ciclo de aprendizado da organização.
A economia da experiência
Da economia industrial à economia da atenção, o que se produz mudou, mas o que se vende sempre foi o mesmo: tempo e confiança.
Hoje, o cliente não paga apenas pelo produto; paga pelo esforço que economiza. Esse é o ponto em que design e economia se tornam indissociáveis. Em microeconomia, chamamos isso de elasticidade da experiência: quanto o aumento de conveniência influencia a propensão à compra e à recorrência. Designers raramente percebem que estão trabalhando com uma função econômica. Cada decisão de layout, copy ou arquitetura de informação desloca a curva de demanda da empresa, alterando a sensibilidade do cliente ao preço, ao esforço e ao risco percebido.
Do ponto de vista executivo, a experiência é o motor da elasticidade: ela define quanto o usuário aceita pagar, quanto tempo tolera esperar e quanto confia em voltar. UX é, portanto, uma engenharia de estímulos que precifica o intangível.
ROI além do Excel
O verdadeiro ROI em UX não está em um número único, mas em uma equação dinâmica:

Só que “Receita Incremental” vai muito além do faturamento.
Ela inclui:
- o aumento da retenção e do LTV,
- a redução de carga operacional,
- e o efeito de rede entre jornadas, produtos e canais.
Do outro lado, “Custo Total” deve incluir complexidade, retrabalho e lentidão decisória. Esses são os novos custos de oportunidade da experiência.
Ao aplicar princípios de produção e custos, estudados em programas do Insper e frameworks de consultorias como McKinsey, é possível entender que o ROI cresce quando Receita Marginal ≥ Custo Marginal (RMg ≥ CMg).
Traduzindo: quando o valor da próxima melhoria em UX supera o esforço necessário para implementá-la.
Cada blueprint bem desenhado, cada componente consolidado em um Design System, reduz o custo marginal das próximas jornadas.
Em outras palavras: o design cria economia de escopo, permitindo que um investimento único gere retorno múltiplo em diferentes produtos.
É o oposto de estética: é estrutura.
Design deixou de ser um “entregável” e passou a ser infraestrutura de impacto. Cada insight, cada blueprint, virou uma camada de dados para decisões futuras.
Esse modelo muda o papel do designer: ele deixa de ser executor e passa a ser arquiteto de eficiência, alguém que cria as condições para que a empresa aprenda com seus próprios comportamentos.
O design como ativo de eficiência
Empresas maduras tratam o Design System, a arquitetura da informação e os fluxos automatizados como ativos de capital produtivo, e não como custos operacionais.
Esses ativos geram três efeitos econômicos diretos:
- Produtividade marginal crescente: cada novo projeto é entregue com menos esforço, mais padrão e menor risco.
- Custo marginal decrescente: o esforço adicional para entregar uma nova jornada se aproxima de zero.
- Valor marginal crescente: cada melhoria reflete em múltiplos pontos da experiência e amplia a percepção de marca.
Essa lógica alinha design à teoria da produção: quanto maior a integração entre times, dados e sistemas, maior o output por unidade de esforço.
No limite, UX se torna uma forma de automação cognitiva, antecipando dores, eliminando fricções e otimizando o comportamento organizacional.
Por isso, o papel do líder de UX não é desenhar telas, mas redesenhar a economia interna da empresa.
Design estratégico não é sobre estética, é sobre explicabilidade.
É sobre construir pontes entre o intangível da experiência e o tangível dos resultados.
Quando IA encontra UX:
o retorno sobre a inteligência
A nova fronteira do ROI não está apenas no retorno sobre investimento, mas no retorno sobre inteligência (Return on Insight).
A IA transformou o design em um sistema vivo, capaz de aprender com cada interação e ajustar fluxos, mensagens e jornadas em tempo real. No campo econômico, isso equivale a uma função de produção adaptativa: quanto mais dados, maior a eficiência marginal. Em vez de esperar o ciclo de análise trimestral, a empresa aprende continuamente.
O ROI deixa de ser um resultado e passa a ser uma taxa de aprendizado.
Essa é a fusão entre experiência, economia e tecnologia:
UX fornece o contexto, IA fornece a predição, e juntas elas criam eficiência dinâmica, a capacidade de evoluir antes que o mercado mude.
Como aponta o Insper em estudos sobre economia comportamental aplicada, as organizações que aprendem mais rápido geram vantagem competitiva sustentável, não por escala, mas por inteligência.
Métricas que importam
Medir UX por cliques é o equivalente a medir produtividade por quantidade de e-mails enviados. O design deve ser mensurado por indicadores que expressem redução de entropia, a ordem criada a partir do caos.
Três dimensões resumem essa maturidade:
- Eficiência operacional: tempo médio de execução, taxa de retrabalho, automação.
- Valor percebido: NPS, CSAT, engajamento ativo e recorrência.
- Elasticidade econômica: variação de uso e receita frente a estímulos de UX (mudança de fluxo, incentivo, simplificação).
Essas métricas não competem com finanças, elas traduzem finanças em comportamento.Quando bem estruturadas, tornam UX e CFO aliados naturais.
O futuro da mensuração
A mensuração do futuro vai além dos dashboards e dos relatórios convencionais. Será guiada por sistemas de aprendizado contínuo, capazes de transformar sinais de jornada em direcionadores de negócio.
O design, nesse contexto, assume o papel de bússola entre custo, valor e crescimento, ajustando a organização a cada nova iteração.
O líder de UX do futuro não gerencia telas: orquestra eficiência.
Ele entende o ROI não apenas como retorno financeiro, mas como retorno de energia, foco e inteligência para o sistema.
À medida que as fronteiras entre UX, IA e economia se dissolvem, surge um novo tipo de liderança, aquela que une método, intuição e mensuração.
Porque no fim, liderar é traduzir complexidade em clareza, e clareza sempre gera valor..
Conclusão – O elo entre
design, economia e valor
Design é, em essência, uma disciplina econômica.
Cada decisão estética carrega uma implicação financeira, e cada escolha de fluxo altera o comportamento de consumo. Quando o design é bem estruturado, ele deixa de ser custo e se torna infraestrutura de valor.
O ROI do design não é apenas o retorno sobre investimento.
É o retorno sobre confiança, sobre tempo e sobre inteligência.
E, como em toda economia eficiente, o verdadeiro lucro está em reduzir o desperdício, de esforço, de ruído e de complexidade.
No fim, o design de alto impacto não é o que encanta. É o que faz o sistema aprender mais rápido do que o mercado consegue copiá-lo.
Felipe Moraes Coletti
Head de UX e pesquisador em Design, Economia e Inteligência Artificial
Criador do UX-Brasil, projeto que explora o impacto econômico da experiência
→ www.ux-brasil.com
